Resiliência

Publicado  sexta-feira, 6 de maio de 2011

Em "Fundamentos da Ciência e Engenharia dos Materiais" (CALLISTER, 1991) ou simplesmente 'Callister' como é mais vulgarmente conhecido entre os discentes (e docentes) da maioria dos cursos de engenharia Brasil afora, podemos encontrar a seguinte definição para o termo 'Resiliência': "Resiliência é a capacidade de um material absorver energia (impacto) quando ele é deformado elasticamente e então, no descarregamento, ter recuperada esta energia. A propriedade associada é o módulo de resiliência, Ur , que é a energia de deformação por unidade de volume requerida para tensionar o material a partir do estado não-carregado até o ponto de escoamento."
Mas vocês devem estar se perguntando: e daí?
Bem, feliz e animado com a vida (?!) como qualquer aluno do terceiro ano de engenharia, eu assistia despretensiosamente a uma pacata e, arrisco-me a dizer, sonolenta aula de Teoria das Organizações. Slide vai, slide vem; bocejo vai, bocejo vem... 'bla bla bla resiliência bla bla bla'. 'Resiliência? É de comer? Acho que eu já ouvi isso antes... Onde mesmo? Ah, é! Na aula de materiais do terceiro semestre.'
Voltei pra casa depois de um longo, longo, loooongo dia de estudos, morto de cansaço. E como todo mundo já deve ter percebido, geralmente uma parte desse cansaço inerente à vida acadêmica é, obviamente, composto pelo esgotamento e saturação da sua paciência e disposição; e a outra parte é feita do pré-cansaço, ou seja, aquele sofrimentozinho que você sente só de pensar em todo o resto das coisas que você AINDA tem que fazer.
Mas, voltando ao assunto, cheguei em casa e... aquela pulga atrás da orelha. 'Cadê o Callister? Merda, vendi pro bixo. Ok, vai no Google mesmo.' Pesquisei 'Resiliência' no Google e, curiosamente, o primeiro resultado da busca era uma definição da Wikipédia. Abri a página e me surpreendi: descobri que, convenientemente, a psicologia havia tomado emprestado o termo para definir "a capacidade do indivíduo lidar com problemas, superar obstáculos ou resistir à pressão de situações adversas - choque, estresse, etc. - sem entrar em surto psicológico". Brilhante! Como eu pude ignorar este conceito por tanto tempo? 'Resiliência...' uma avalanche de pensamentos me fez imóvel por alguns instantes (como quando você mergulha em si mesmo, não se mexe e nem se percebe estátua viva, e quando se dá conta, a visão já está embaçada...).
Então concluí que a resiliência é o único atributo importante na vida de qualquer pessoa.
Não importa de que raça você seja, qual o seu emprego, sua idade.
Não importa se você é religioso, se você não gosta de picles, se você é o presidente!
E ainda, não importa que você não se importa, porque isso não fará a resiliência menos importante.
O jeito como você lida com as adversidades; a maneira como você agüenta o tranco e absorve aquilo para depois tentar transformar em algo positivo (ou negativo); isso é o que determina tudo.
Portanto a palavra do dia é: resiliência.

O desencarne

Publicado  domingo, 1 de maio de 2011

"O que se tornou perfeito, inteiramente maduro, deseja morrer." (Nietzsche)

"Só há um problema filosófico verdadeiramente sério: é o suicídio. Julgar se a vida merece ou não ser vivida, é responder a uma questão fundamental da filosofia." (Camus)

Mas por que todos buscam tão desesperadamente justificar sua vida e seus objetivos?
A todo o momento e em qualquer lugar as pessoas, incansáveis, se lançam na jornada incessante cujo único e infrutuoso objetivo é provar sua existência.
A grande parte de tudo o que há para ser visto ou vivido serve exclusivamente para desviar o foco de nossa atenção da questão central e única importante: a morte.
O porquê de todos os porquês; o fim; o assunto incômodo e recorrente de qual todos fogem consciente ou inconscientemente.
Mas como explicar o inexplicável?
Como traduzir em palavras o que só pode ser sentido?
É como começar uma explanação sabendo de antemão ser incompreendido.
As pessoas não temem a morte porque elas não são capazes de pensar seriamente a respeito dela.
Se o fizessem, não conseguiriam seguir normalmente com suas vidas.
Quando um indivíduo considera verdadeiramente a morte e suas implicações, um medo avassalador, por falta de outro termo mais apropriado, toma conta dele.
Não é um medo comum, como o medo de se machucar ou medo de perder algo que se ama.
É um medo absoluto e total, tão profundo que coloca tudo em perspectiva.
Inicialmente, esse medo fornece ao indivíduo um sentido aguçado das coisas, e em seguida proporciona um nível superior e muito elevado de consciência.
Uma espécie de iluminação.
A maioria das pessoas nasce, vive e morre sem nunca ter vivenciado essa clareza profunda de realidade, essa 'lucidez perigosa' nas palavras de Clarice.
É como aquela sensação estranha ao sair do cinema: num momento estamos dentro de uma realidade e de repente, ao abrir das portas, voltamos ao 'normal'.
O problema é que é impossível vivenciar essa lucidez, essa sensação de estar infinitamente maior que si mesmo, e simultaneamente estar preso às tarefas do cotidiano, já que são antagônicos.
As coisas mundanas estão a toda hora nos alienando, cegando nossa visão, puxando-nos para baixo.
É conveniente não pensar sobre isso, e a rotina engole facilmente as reflexões e mascara as conclusões.
A verdade insuportável e inexorável é que nada existe realmente porque tudo algum dia deixará de existir.
E deixar de existir, à parte a religião e as crenças, é aterrorizante, como poucas ou nenhuma outra coisa é.
Sumir, desaparecer.
Você se lembra como tudo era antes de você nascer?
Pois as coisas voltarão a ser daquela maneira.
Reordene por importância os elementos da sua vida agora.
Percebe a insignificância?
Não é frustrante? Não é triste? Não é desesperador?
Essa noção de certa forma consagra os suicidas como corajosos, porque ao invés de continuarem protelando a mentira do efêmero, eles adiantam o inevitável: vão à busca da verdade até as últimas conseqüências.
Vamos, apegue-se a algo. Maomé, Osho, Cristo, escolha um.
Vamos, feche os olhos, vai passar.
Do pó ao pó: nunca fez nem fará tanto sentido como agora.

Saudade de casa

Publicado  quarta-feira, 20 de abril de 2011

tô com saudade danada de casa viu!

Eu tô me controlando à vera pra não te esquecer, porque na coleção de tempos bons que eu guardei pra mim, a cada dia eu te mato um pouco mais em mim. Por mais voraz que eu procurei nos tempos do mundo, eu aprendi com tudo, na voz do coração, nos segredos das setas e contramão. Me deixa passar pra colorir o que há de mais bonito em mim, me deixa brincar com a solidão, espalhar meus sorrisos por aí...
Passa nos ponteiros, devagar, a lógica no globo azul e a certeza que eu amei demais. Se eu me confundi nos sonhos, nos livros que eu li, na fé disparada de quando eu fui dois ou nada, sozinho eu sempre fui o rei de mim.

Diário da anorexia intelectual, cap. 2

Publicado  quinta-feira, 14 de abril de 2011

Entrou em casa como se adentrasse o velório dos próprios ideais.
O egoísmo; a cólera; a ganância; a crueldade.
A morte.
Os males inapeláveis do homem.
E os seus também, sem sombra de dúvida.
Não queria mais pensar naquilo; queria paz, queria resignação, pour enfanter de belles pensées.
Queria hedonismo, queria alienação optada.
Era terrível não conseguir enxergar claro através do inferno dos próprios pensamentos.
Não sabia até que ponto o efeito Pigmalião havia transformado sua percepção, mas, irresoluto, decidiu deixar aquilo de lado.
"É inconcebível..." - murmurou desfalecido.
Não entendia como a incongruência da vida podia desapontá-lo tão mais que as outras pessoas.
Como viver subjugado ao horror da realidade?
Era impraticável atravessar os dias daquela maneira.
Estudava, conversava e até ria, mas ao cair da noite, as mesmas idéias o assombravam.
Deitava-se, tentava dormir, tentava esquecer.
Tudo em vão.
E não importava o quão grande fosse seu amor ou o quão grande fosse sua dor, nenhum abriria caminho na desesperança da noite.
"A iniqüidade não têm remédio... eu não tenho remédio" - pensava.
Seus devaneios eram tão profundos que ele chegava a se comparar a Fausto.
Mas então amanhecia, e a rotina engolia as queixas, o medo, a dúvida... a lucidez.
E pouco a pouco, imperceptivelmente, o sofrimento começava a dar-lhe personalidade.
E, ainda que contra sua vontade, sem mágoa nem saudade, enfim, o tempo passou...
Porque o dia em que ele deixou morrer em si a perplexidade foi o mesmo em que ele se compadeceu dos homens, e afinal descobriu que a bondade não é uma virtude passiva.

Você

Publicado  sexta-feira, 8 de abril de 2011

Você foi indo embora os poucos da minha vida, e eu preciso agora de um consolo imediato. Eu não sei se sinto a sua falta porque eu não sei mais o que sinto, ficou um buraco. Você tirou de mim tudo o que era nosso e tirou de mim tudo o que era meu, você me tirou do eixo, me tirou do meu fuso, da minha rota. Me tirou de onde eu estava, me tirou de tudo quanto foi lugar que você achou que eu não cabia e eu só fui indo, indo, indo, sendo tirada de cá pra lá, a todo momento, vagando pela vida sem precisar.

Você foi meu por tanto tempo que me dá medo de deixar doer tudo o que eu acho que ainda tem pra secar. E você foi meu por tanto tempo que às vezes parece que tudo foi gasto entre a gente, até a dor e, mesmo quando eu forço ficar triste por obrigação de sentir a sua falta, ela não vem.

Você me conheceu menina, e me viu virar mulher. Você leu todos os meus textos falando de outras pessoas, você esteve presente em todos os momentos da minha vida em que eu achei que só a sua aprovação era importante. Você enxergou em mim a minha tristeza despedaçada e me falou tantas vezes que você era a cola que ia manter meu castelo de sonhos montado. Mas depois, você montou em cima dos meus sonhos, bloqueando qualquer visão que eu pudesse ter pra eles, me fazendo achar que além do horizonte do seu sorriso não se achava mais nada.

Você viu em mim qualidades que ninguém até então tinha tido sensibilidade de encontrar, você conheceu meus olhos de bom dia e de boa noite, meus olhos de felicidade, de saudade e de tristeza, você conheceu minha boca que se comprime quando a vida discorda comigo e eu não acho outra saída a não ser amarrar o choro no bico. Você me deixou te ver por debaixo da armadura que todo mundo conhece, você deitou tanto comigo em tantos lugares que aquela sua perna pesada que bloqueava a minha circulação toda santa noite virou minha perna também e, depois de um tempo, nem meu sangue ligava mais de ter o seu destino bloqueado por você.

Você me amou tanto que, mesmo sem poder me amar direito, não queria me deixar ir e foi matando nosso amor aos poucos, usando contra mim todas as coisas que um dia foram tudo o que eu ofereci de encantador a você. Você puxou todos os meus limites e me fez descobrir partes de mim que eu não sabia que existiam, você trouxe o melhor e o pior, trouxe aquela sensação de frio na barriga eterno, de ansiedade constante, de não saber se vai ser possível respirar até o pulmão encher porque, antes mesmo do final do respiro já se sente falta de ar.

Você foi meu de verdade, foi meu com tudo, foi meu de noite até de dia por todos os dias de todos esses anos que eu vivi você mais do que vivi comigo. Por todos os dias que eu acordei de manhã e precisava saber do quê você precisava, antes de eu me lembrar que eu também era uma pessoa e também precisava de tantas coisas.

E eu fui embora porque por mais que eu tentasse, por mais que eu chorasse, rezasse, desejasse, implorasse, suplicasse, abaixasse, ajoelhasse, gritasse, sussurrasse e pensasse, eu percebi que a minha necessidade de você nunca seria suprida já que, de alguma maneira que até agora eu não sei, você me roubou de mim e a minha busca era sem fim porque não era certeira.

E pela primeira vez em muitos anos eu entendi que eu estava precisando de mim, não de você.

E mesmo enquanto eu me ajoelho e reúno do chão os pedaços de mim, não posso negar que muitos deles são completamente seus. A gente se bagunçou tanto que só a música do Chico consegue explicar a minha sensação de ter o seu paletó enlaçado no meu vestido aonde quer que eu vá. Você vai pra sempre fazer parte do que está em mim e, mesmo com olhos céticos, tudo o que a gente teve de tão bonito nunca vai mudar.

‘Só amor não adianta’, a gente repetiu tantas vezes. E eu precisei não poder mais enxergar você na minha vida que era pra ver se, assim, eu conseguia começar qualquer frase, qualquer conversa, qualquer pensamento e qualquer texto com alguma outra palavra que não ‘você’.

E o meu discurso antigo (que é seu) diria com a sua voz (da qual conheço todos os tons) que pra mim o nosso amor não passou de um monte de experiências exageradas pra virar, no final, um texto bonito.

Eu, entretanto, discordo. Pra mim o nosso amor foi verdadeiro e é uma pena que ele termine assim, reunido num monte de palavras tristes no chão, sem cola.

O meu castelo desabou e eu preferi reconstruir meu mundo sem você. Por escolha, não por falta de amor.

Correr devagar para correr sempre

Publicado  domingo, 27 de março de 2011

"...Abrace a vida e viva com paixão, perder com classe e vencer com ousadia, porque o mundo pertence a quem se atreve e a vida é muito para ser insignificante."
[para um texto piegas, uma boa frase de efeito. Do nada piegas, Charlie Chaplin.]


.::. A vida deu uma bagunçada e uma arrumada, quase que instantânea, que foi só pra me dar um sacode e eu enxergar que do jeito que estava não podia continuar. Que era pra eu entender que nem todos os meus por causa iriam ter algum porque, mas que todos os meus poréns não eram e nem nunca tinham sido em vão. Não era em vão pensar demais, mesmo quando só se pensa bobeira. Nenhuma cabeça morreu de pensar, não ia ser a minha.

Engraçado encontrar elementos do passado no presente e sentir que eles simplesmente já não fazem mais parte do cenário. Uma cadeira, um abajur, uma mesa, um ex namorado. Não combina.

Me olho meio mutante no meio dos acontecimentos que não param nunca. Um dia sou o caos que não consegue lidar nem mesmo com a lentidão do que não acontece porque nunca vai acontecer, de qualquer forma. No outro sou ansiedade borbulhando pra fora dos poros, pra fora da boca, pra fora de casa. Ficar em casa começa a irritar e eu quero mais é ver gente, mesmo que há poucos dias atrás eu estivesse sofrendo a síndrome da lagarta no casulo. Metáfora babaca de menina de 15 anos em seu aniversário de debutante, eu sei, mas quem sabe hoje, pelo menos, eu não consiga virar borboleta.

Eu não andava precisando da frescura, mas sim do frescor adolescente.

Acontece que a vida vai rápido por mais que, em alguns dias da minha, eu tenha a necessidade de ir mais devagar. Aí quando me dou conta, já saí correndo meio que sem rumo, porque pra mim nunca foi admissível ficar para trás. Aí uma amiga me diz que, pra eu entender da onde vem o drama todo, eu tenho que me colocar na terceira pessoa e contar pra mim mesma o que a burra da minha amiga superegodescontrolada fez. Amigas e mães muitas vezes têm toda razão mesmo quando não são chamadas.

Então tá bom, e eu conto detalhadamente mesmo que o interlocutor não tenha exatamente meus olhos, tampouco minha idade e, menos ainda, minha formação acadêmica. Estranho sim pagar para receber conselhos, mas eu prefiro acreditar, então, que não passa de um maduro outro ponto de vista. Tem sido bom, faz olhar pra trás, mas andar pra frente.

Bom ver que ninguém passou por mim por acaso e que nenhuma das minhas experiências gritadas religiosamente em sua ordem cronológica por meio do que eu escrevo ficaram mofadas em mim sem ter deixado nada delas em que eu possa me espelhar lá na frente. A real é que desde sempre foi complicado entender o que eu sinto, mas eu sempre tentei desenhar em palavras para, quem sabe alguém mais ou menos desocupado do que eu, pudesse entender por mim. Não deu.

Se todos eles tiveram que chegar e, sem nenhuma exceção, tiveram que partir, onde está escondido o grande problema que não deixa e estada ser maior? Pode ser a incompatibilidade - e eu adoro pôr a culpa nela -, pode ser a maneira como as coisas são demonstradas, ou até mesmo a forma de oferecer estadia, mas pode não ser nada disso porque, se fosse tão óbvio assim, eu já teria descoberto.

Vou assim então, devagar e sempre, mesmo que a parte do devagar pareça piada para uma pessoa como eu, que sempre extravasou tanto.

Todo amor que houver nessa vida

Publicado  segunda-feira, 21 de março de 2011

E, na verdade, ela só queria saber quando foi que tudo virou isso, desse jeito confuso e pesado que é agora, que dói de respirar, de comer, de pensar. Acordar com vontade de voltar a dormir porque encarar a vida se tornou uma tortura que se repete. Os dias se repetem esfregando na cara tudo o que ela tem de bom na vida, mas não dá valor.

E vai ver que aquela outra, que olha tudo com olhos grandes, esteja certa. Vai ver que a vida desta seja mesmo tão sem graça que é melhor querer a da outra. Vai ver que a explicação que ela vai dar é que, melhor do que sofrer sem amor, é sofrer por causa dele. Porque enquanto pra uma é tanto vazio, pra outra é tudo o que se tem de máximo, misturado. Sabe a sensação de gostar tanto, de querer tanto, de precisar tanto que chega a sufocar? Sabe ir dormir à noite com medo do que vai sonhar e acordar de manhã tateando o nada, até encontrar o que quer e ter certeza de que ele ainda esta lá?

Ela sentia. Sentia até cortar as linhas da sua racionalidade. Ela sabia até sangrar sem ninguém ver, justamente pra doer sem sentido nos olhares do mundo.

Pra querm sempre amou de pouquinhos, porque nunca iria se entregar inteira, amar de verdade machuca porque exige demais. Exige mais paciência do que ela parece ter, mais companheirismo do que consegue dar, mais amor próprio porque quando ela ama, ela ama muito e é fiél demais. Não dá pra amar igual duas pessoas ao mesmo tempo.

É como se tudo o que ela sempre disse estivesse se voltando contra ela mesma, por vingança ou qualquer coisa, por vontade de fazer não ser tão fácil agora que é alguma coisa de verdade. Como uma punição por ela ter sempre sido tão dramática com coisas pequenas, com as bobeiras e as pessoas de meias horas. Vai ver sofrer assim agora era uma maneira de sempre lembrar de quando ela sofria de mentira, pra mostrar qualquer coisa pro mundo que ela tinha certeza que a enxergava, pra provar qualquer coisa pra alguém que, até hoje, ela nao conseguiu descobrir quem é.

Só que está ficando feio. E a sujeira vai transbordando dela em direçào à ele. O amor que ele sente por ela se quebrando em pedaços pequenos porque o que existe dentro dela é tão forte que parece que não vai embora jamais. Ele abraçava seus braços, tapava seus ouvidos, segurava sua cabeça pra cima, mantinha-a erguida porque o discernimento dela estava caído, de novo, naquele chão e, se ela olhasse pra baixo, só iria escorrer mais. Ele segurava de todos os lados, de todos os jeitos, com todas as forças, mas não adiantava e, talvez, ele tivesse mesmo já descoberto que proteger alguém de si mesmo é – se não a mais – uma das tarefas mais difíceis desse mundo.

E não adianta ele querer muito e ela jurar que consegue se, no fundo, ela não está tentando como devia e ele não está acreditando com todo o coração. O coração dele também morreu, e ela sabe que a culpa é dela.

Então a história vai seguir assim, ele do seu lado e o mundo contra ela porque, repare, ela mesma não conseguiu ainda se encontrar e embora sua companhia esteja cheia a sua alma está vazia.

Minha certeza não é certa

Publicado  sábado, 5 de março de 2011

"...Pois tudo o que se sabe do amor/ É que ele gosta muito de mudar/ E pode aparecer onde ninguém ousaria supor..."
[adriana calcanhoto, na voz de marisa. é de apertar o repeat. incrível.]


.::. Na minha frente havia dois caminhos. E eram, os dois, floridos.

A vida inteira não me faltou despudor e desprendimento de abandonar a metade do que quer que fosse, para me completar do que quer que me enchesse mais por aí a fora. Não me faltou coragem de tentar de novo, mesmo quando ardia por dentro e aquilo que batia sozinho, no escuro, pedia pra eu parar, por favor.

Fantasiada de carência, a minha liberdade passeava folgada por toda parte.

Ouvindo Marisa Monte em notas doídas e compassadas. Comparadas a Chico Buarque, tristemente profundo, desafinado e verdadeiro. Se Chico fosse afinado, seu samba seria a perfeição, e há de se convir que muita gente já derrama litros de emoções com a imperfeição, imagine então, com o contrário. Chico emociona porque tem a verdade errada das coisas; Marisa dói, porque é bonito e, beleza demais, machuca.

Procurando bem, todo mundo tem pereba, só a bailarina que não tem.

E tanto tempo passou desde quando era fácil depositar as culpas e os fracassos na vontade de ter afago de quem quer que fosse. Afago pra chamar de seu. Faz tempo que a minha vontade de cafuné virou vontade de quebra cabeça, sem frestas, sem furos, nem espaços por onde pudesse fugir a minha metade torta.

Enquanto o tempo passava, a minha certeza de uma só metade ficou perdida no meu quebra-cabeça completo de peças sem encaixe.

Mas eles são dois. Dois, e apenas dois, de tantos que falam comigo todos os dias, dentro do meu cérebro apressado nas ruas de São Paulo. São eles que andam comigo nas ruas arborizadas dos Jardins e pelo fedor calorento da yakisoba da Avenida Paulista. Andam comigo - e em mim - aonde quer que eu vá, de lá pra cá. Andam de fora pra dentro de mim, e saem de mim ainda mais fortes gritando paródias pelo mundo.

O poeta é um fingidor.

E da hora que eu acordo, até o último frame de segundo em que meus olhos se mantém abertos, o radar sensível que - por alguma razão - se instalou dentro de mim, capta as nuances e armazena. Sou um arquivo ambulante de coisas pela metade, mas a verdade é que, mesmo em pedaços, a minha mágoa é inteira porque, quando o mundo inteiro grita as desilusões de todas as pessoas no seu ouvido, acaba-se sofrendo um pouco por cada uma delas, também.

Sofrer vocês é sofrer a minha eterna dúvida de não saber o que é melhor pra mim.

Começo coisas e paro pela metade não porque eu não queira ver o final feliz se estampar no meu rosto desacreditado. Interrompo o gozo no meio porque, pra mim, a aflição dos novos começos atropela a calmaria do que já é meu.

Não é que eu não ame você, é só que eu não tenho certeza.
Os Strokes têm razão.

Mas a minha racionalidade se perdeu justamente onde eu a encontrei. Naturalidade demais me rendeu infelicidade, mas quando resolvi ser simetricamente certeira, perdi a emoção.

Finjo, então, ser dor. Aquela que sinto de verdade.
E vou.

No estreito do meio das decisões, esperando não haver escapatória, ignorando a visão das laterais, curvada, escondida, cardiacamente apressada por um final que, nem eu mesma, poderia palpitar.

Na minha frente há dois caminhos. E são, os dois, floridos.
Eu continuo sem buquê.


Por um final menos medíocre

Publicado  segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Algumas vezes era muito fácil diferenciar quem ia sair ferrado de uma história logo de cara, a partir do primeiro segundo depois que ela tinha começado. Mas o "algumas vezes" está aí justamente para delimitar a constatação de que não, nem sempre existem mocinhos, bandidos e princesas presas no topo do castelo. O sonho de Rapunzel passou por todas as meninas que eu conheci nessa vida, mas ainda está pra nascer a bem amada que recebeu o homem perfeito à Mr. Big do Sex and the City na sua varanda em qualquer manhã dessas.
E era no passado porque a visão turva resultante de tantos olhares míopes numa multidão de desinteressados desinteressantes já não conseguia ver brilho em muita coisa simples que esbarrava aqui e ali. E ela era sempre ela no meio deles, mas eles nunca eram os mesmos diante dela. As histórias se repetiam e o amargo do erro fazia a euforia do acerto padecer mais cedo. O mito do cafajeste não sai da cabeça dela. E pra ela nunca está bom do jeito que está.
Acabava se cobrando demais por não saber ao certo o que ela tinha que arrancar das pessoas, no meio da catástrofe dentro dela. Não era coração - porque esse ela já não entendia muito bem do que se tratava - , era cérebro. Se sentia burra a cada novo começo que se tornava mais um fim no final das coisas. O final das coisas amedrontava, mas já não era como antes. Nada era como antes e ele ainda enaltecia, de certa forma, a eterna posição de desespero, que ela queria manter, para assustar quem ousasse se aproximar demais da crosta fria ao redor dela.
Não que ela quisesse magoar demais para sofrer de menos, não que fosse mais prático gritar a todos os pulmões que não quer mais depois que já teve, não que para ela fossem flores, ou folhas, ou bonito dizer o que não se quer ouvir, o que não se quer dizer, o que ninguém nunca quer falar e nem saber. Ela está feia por tentar tanto e não perceber que o que falta é ter força suficiente para ir até o fim de verdade e viver, indescritivelmente, as coisas que ela cria na cabeça e saem todas pela metade, pela pressa de ser tantas, em uma só.
Um dia, em algum dos passados que já foram contados aqui, ali e acolá, ela resolveu que seria uma mulher descritiva. Contou cada peculiaridade das coisas estranhas que sentia, que fazia sentir. Ela chorou as mágoas em público e abriu caminho para muitas outras delas entrarem, numa metástase confusa de quem sofre por opção de não ter a opção de ver o espetáculo parar.
Alguns se vão por vontade própria. Outros, são convidados a se retirar. E ela passa a vida descrevendo as coisas que tantos sentem através dela, se tornando ela mesma, a mais frígida das mulheres perante seus próprios sentimentos.

Prelúdio à dissidência

Publicado  sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

E mesmo depois de tanto tempo, tocar naquele buraco escuro e cheio de sofrimento era muito difícil.
Há muito ele havia encontrado seu próprio jeito de fechar os olhos e engolir todos os pesares.
Um processo de despejar as decepções em algum ponto abissal da alma que inexoravelmente havia tornado seu coração sáxeo.
Aquilo de certa forma o satisfazia: preencher o vazio, ainda que com mágoas.
A disparidade entre seus imperativos categóricos e a pungente realidade não lhe deixava escolha.
Ele nunca quis ser triste.
E para os dotados daquele velho chauvinismo ignorante que argumenta paralógica e etnocentricamente que os tristes são somente os fracos de opinião, com problemas de auto-afirmação ou pessimistas sem auto-estima... que fossem para o inferno!
As pessoas não escolhem voluntariamente a tristeza.
Mas ela toma conta, domina, introjeta, assimila, seduz.
Sim, seduz.
Existe uma beleza oculta na tristeza.
E embora haja íntima ligação dela com a solidão, aqueles que são tristes, por mais que não saibam ou não sintam, nunca estão sozinhos.
A tristeza é uma língua universal.
Sem distinções.
É claro, ele ainda não entendia.
Então, como nunca havia acontecido nem nunca tornaria a acontecer, ela surgiu.
Sublime, inteira, irretocável.
Com um sorriso radiante, iluminava não só os lugares mas também as pessoas de uma maneira suave e inebriante.
Apesar de bonita, não era vaidosa, nem arrogante.
Ele irremediavelmente se apaixonou.
Contudo, o amor é um privilégio de maduros, e aquele desejo inconfesso de tê-la ao seu lado trouxe consigo um exame de consciência.
Ele percebeu logo que, mergulhado em sua dor atroz, ela nunca seria capaz de amá-lo.
Ela nunca poderia sentir por ele nada mais do que pena.
E foi assim que começou a história da batalha contra seu maior inimigo: ele mesmo.









p.s.: Marília, eeeuu jáááá saaabiiiiaaaa haha! PARABÉÉÉÉÉÉNS :D

Liberdade é pouco...

Publicado  quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

...o que eu desejo ainda não tem nome.
(Clarice Lispector)


Sabe-se lá para onde estou indo, inserto esse destino que modificou tudo que estava planejado...Era certo o caminho traçado, era livre e calmo.
E de repente ele entra em ação e muda tudo a sua volta, modifica suas emoções, ensina muito e prova a cada dia que ninguém é feliz sozinho.
Abençoados os que aceitam o destino, sorte daqueles que entendem pra onde estão indo.
Eu sigo em frente, e sabe-se lá onde vou chegar. Só sei que vou estar de coração aberto pra tudo que é novo, não importa pra onde vou, se existir amor pra me acompanhar, não importa se é longe ou perto se existir mudança para se conhecer, não importa se vou de barco, de carro de avião, a passos leves se minha emoção me acompanha.
Não importa quando vou chegar, se estiver pronta pra seguir em frente!

Feliz 2011 e que esse seja o ano de sua vida!!!