O desencarne

Publicado  domingo, 1 de maio de 2011

"O que se tornou perfeito, inteiramente maduro, deseja morrer." (Nietzsche)

"Só há um problema filosófico verdadeiramente sério: é o suicídio. Julgar se a vida merece ou não ser vivida, é responder a uma questão fundamental da filosofia." (Camus)

Mas por que todos buscam tão desesperadamente justificar sua vida e seus objetivos?
A todo o momento e em qualquer lugar as pessoas, incansáveis, se lançam na jornada incessante cujo único e infrutuoso objetivo é provar sua existência.
A grande parte de tudo o que há para ser visto ou vivido serve exclusivamente para desviar o foco de nossa atenção da questão central e única importante: a morte.
O porquê de todos os porquês; o fim; o assunto incômodo e recorrente de qual todos fogem consciente ou inconscientemente.
Mas como explicar o inexplicável?
Como traduzir em palavras o que só pode ser sentido?
É como começar uma explanação sabendo de antemão ser incompreendido.
As pessoas não temem a morte porque elas não são capazes de pensar seriamente a respeito dela.
Se o fizessem, não conseguiriam seguir normalmente com suas vidas.
Quando um indivíduo considera verdadeiramente a morte e suas implicações, um medo avassalador, por falta de outro termo mais apropriado, toma conta dele.
Não é um medo comum, como o medo de se machucar ou medo de perder algo que se ama.
É um medo absoluto e total, tão profundo que coloca tudo em perspectiva.
Inicialmente, esse medo fornece ao indivíduo um sentido aguçado das coisas, e em seguida proporciona um nível superior e muito elevado de consciência.
Uma espécie de iluminação.
A maioria das pessoas nasce, vive e morre sem nunca ter vivenciado essa clareza profunda de realidade, essa 'lucidez perigosa' nas palavras de Clarice.
É como aquela sensação estranha ao sair do cinema: num momento estamos dentro de uma realidade e de repente, ao abrir das portas, voltamos ao 'normal'.
O problema é que é impossível vivenciar essa lucidez, essa sensação de estar infinitamente maior que si mesmo, e simultaneamente estar preso às tarefas do cotidiano, já que são antagônicos.
As coisas mundanas estão a toda hora nos alienando, cegando nossa visão, puxando-nos para baixo.
É conveniente não pensar sobre isso, e a rotina engole facilmente as reflexões e mascara as conclusões.
A verdade insuportável e inexorável é que nada existe realmente porque tudo algum dia deixará de existir.
E deixar de existir, à parte a religião e as crenças, é aterrorizante, como poucas ou nenhuma outra coisa é.
Sumir, desaparecer.
Você se lembra como tudo era antes de você nascer?
Pois as coisas voltarão a ser daquela maneira.
Reordene por importância os elementos da sua vida agora.
Percebe a insignificância?
Não é frustrante? Não é triste? Não é desesperador?
Essa noção de certa forma consagra os suicidas como corajosos, porque ao invés de continuarem protelando a mentira do efêmero, eles adiantam o inevitável: vão à busca da verdade até as últimas conseqüências.
Vamos, apegue-se a algo. Maomé, Osho, Cristo, escolha um.
Vamos, feche os olhos, vai passar.
Do pó ao pó: nunca fez nem fará tanto sentido como agora.

2 comentários:

Anônimo disse...

Mas o suicídio prematuro não seria um ato covarde ou no mínimo arrogante? Um ato de alguém que já se julga tão sábio e que por isso acha que a vida não tem mais nada a lhe ensinar e por isso resolve simplesmente pular essa etapa?
E o suicídio por causa de algum sofrimento não seria um ato covarde, logo não digno de honra, qualquer que seja o sofrimento? E sobre a morte, realmente é difícil pensar sobre ela e eu, jovem como sou, não me atrevo a falar que já pensei seriamente sobre. Muito bom texto!

Mayla Magne disse...

Eu acho que eh fácil viver pensando no futuro....dificil mesmo eh viver no presente...ninguem nunca lhe disse que seria fácil...ninguem nunca perguntou sua opinião sobre o seu nascimento...simplesmente lhe colocaram no mundo, deram uns tapinhas no seu bumbum e disseram: VAI !!!