Correr devagar para correr sempre

Publicado  domingo, 27 de março de 2011

"...Abrace a vida e viva com paixão, perder com classe e vencer com ousadia, porque o mundo pertence a quem se atreve e a vida é muito para ser insignificante."
[para um texto piegas, uma boa frase de efeito. Do nada piegas, Charlie Chaplin.]


.::. A vida deu uma bagunçada e uma arrumada, quase que instantânea, que foi só pra me dar um sacode e eu enxergar que do jeito que estava não podia continuar. Que era pra eu entender que nem todos os meus por causa iriam ter algum porque, mas que todos os meus poréns não eram e nem nunca tinham sido em vão. Não era em vão pensar demais, mesmo quando só se pensa bobeira. Nenhuma cabeça morreu de pensar, não ia ser a minha.

Engraçado encontrar elementos do passado no presente e sentir que eles simplesmente já não fazem mais parte do cenário. Uma cadeira, um abajur, uma mesa, um ex namorado. Não combina.

Me olho meio mutante no meio dos acontecimentos que não param nunca. Um dia sou o caos que não consegue lidar nem mesmo com a lentidão do que não acontece porque nunca vai acontecer, de qualquer forma. No outro sou ansiedade borbulhando pra fora dos poros, pra fora da boca, pra fora de casa. Ficar em casa começa a irritar e eu quero mais é ver gente, mesmo que há poucos dias atrás eu estivesse sofrendo a síndrome da lagarta no casulo. Metáfora babaca de menina de 15 anos em seu aniversário de debutante, eu sei, mas quem sabe hoje, pelo menos, eu não consiga virar borboleta.

Eu não andava precisando da frescura, mas sim do frescor adolescente.

Acontece que a vida vai rápido por mais que, em alguns dias da minha, eu tenha a necessidade de ir mais devagar. Aí quando me dou conta, já saí correndo meio que sem rumo, porque pra mim nunca foi admissível ficar para trás. Aí uma amiga me diz que, pra eu entender da onde vem o drama todo, eu tenho que me colocar na terceira pessoa e contar pra mim mesma o que a burra da minha amiga superegodescontrolada fez. Amigas e mães muitas vezes têm toda razão mesmo quando não são chamadas.

Então tá bom, e eu conto detalhadamente mesmo que o interlocutor não tenha exatamente meus olhos, tampouco minha idade e, menos ainda, minha formação acadêmica. Estranho sim pagar para receber conselhos, mas eu prefiro acreditar, então, que não passa de um maduro outro ponto de vista. Tem sido bom, faz olhar pra trás, mas andar pra frente.

Bom ver que ninguém passou por mim por acaso e que nenhuma das minhas experiências gritadas religiosamente em sua ordem cronológica por meio do que eu escrevo ficaram mofadas em mim sem ter deixado nada delas em que eu possa me espelhar lá na frente. A real é que desde sempre foi complicado entender o que eu sinto, mas eu sempre tentei desenhar em palavras para, quem sabe alguém mais ou menos desocupado do que eu, pudesse entender por mim. Não deu.

Se todos eles tiveram que chegar e, sem nenhuma exceção, tiveram que partir, onde está escondido o grande problema que não deixa e estada ser maior? Pode ser a incompatibilidade - e eu adoro pôr a culpa nela -, pode ser a maneira como as coisas são demonstradas, ou até mesmo a forma de oferecer estadia, mas pode não ser nada disso porque, se fosse tão óbvio assim, eu já teria descoberto.

Vou assim então, devagar e sempre, mesmo que a parte do devagar pareça piada para uma pessoa como eu, que sempre extravasou tanto.

Todo amor que houver nessa vida

Publicado  segunda-feira, 21 de março de 2011

E, na verdade, ela só queria saber quando foi que tudo virou isso, desse jeito confuso e pesado que é agora, que dói de respirar, de comer, de pensar. Acordar com vontade de voltar a dormir porque encarar a vida se tornou uma tortura que se repete. Os dias se repetem esfregando na cara tudo o que ela tem de bom na vida, mas não dá valor.

E vai ver que aquela outra, que olha tudo com olhos grandes, esteja certa. Vai ver que a vida desta seja mesmo tão sem graça que é melhor querer a da outra. Vai ver que a explicação que ela vai dar é que, melhor do que sofrer sem amor, é sofrer por causa dele. Porque enquanto pra uma é tanto vazio, pra outra é tudo o que se tem de máximo, misturado. Sabe a sensação de gostar tanto, de querer tanto, de precisar tanto que chega a sufocar? Sabe ir dormir à noite com medo do que vai sonhar e acordar de manhã tateando o nada, até encontrar o que quer e ter certeza de que ele ainda esta lá?

Ela sentia. Sentia até cortar as linhas da sua racionalidade. Ela sabia até sangrar sem ninguém ver, justamente pra doer sem sentido nos olhares do mundo.

Pra querm sempre amou de pouquinhos, porque nunca iria se entregar inteira, amar de verdade machuca porque exige demais. Exige mais paciência do que ela parece ter, mais companheirismo do que consegue dar, mais amor próprio porque quando ela ama, ela ama muito e é fiél demais. Não dá pra amar igual duas pessoas ao mesmo tempo.

É como se tudo o que ela sempre disse estivesse se voltando contra ela mesma, por vingança ou qualquer coisa, por vontade de fazer não ser tão fácil agora que é alguma coisa de verdade. Como uma punição por ela ter sempre sido tão dramática com coisas pequenas, com as bobeiras e as pessoas de meias horas. Vai ver sofrer assim agora era uma maneira de sempre lembrar de quando ela sofria de mentira, pra mostrar qualquer coisa pro mundo que ela tinha certeza que a enxergava, pra provar qualquer coisa pra alguém que, até hoje, ela nao conseguiu descobrir quem é.

Só que está ficando feio. E a sujeira vai transbordando dela em direçào à ele. O amor que ele sente por ela se quebrando em pedaços pequenos porque o que existe dentro dela é tão forte que parece que não vai embora jamais. Ele abraçava seus braços, tapava seus ouvidos, segurava sua cabeça pra cima, mantinha-a erguida porque o discernimento dela estava caído, de novo, naquele chão e, se ela olhasse pra baixo, só iria escorrer mais. Ele segurava de todos os lados, de todos os jeitos, com todas as forças, mas não adiantava e, talvez, ele tivesse mesmo já descoberto que proteger alguém de si mesmo é – se não a mais – uma das tarefas mais difíceis desse mundo.

E não adianta ele querer muito e ela jurar que consegue se, no fundo, ela não está tentando como devia e ele não está acreditando com todo o coração. O coração dele também morreu, e ela sabe que a culpa é dela.

Então a história vai seguir assim, ele do seu lado e o mundo contra ela porque, repare, ela mesma não conseguiu ainda se encontrar e embora sua companhia esteja cheia a sua alma está vazia.

Minha certeza não é certa

Publicado  sábado, 5 de março de 2011

"...Pois tudo o que se sabe do amor/ É que ele gosta muito de mudar/ E pode aparecer onde ninguém ousaria supor..."
[adriana calcanhoto, na voz de marisa. é de apertar o repeat. incrível.]


.::. Na minha frente havia dois caminhos. E eram, os dois, floridos.

A vida inteira não me faltou despudor e desprendimento de abandonar a metade do que quer que fosse, para me completar do que quer que me enchesse mais por aí a fora. Não me faltou coragem de tentar de novo, mesmo quando ardia por dentro e aquilo que batia sozinho, no escuro, pedia pra eu parar, por favor.

Fantasiada de carência, a minha liberdade passeava folgada por toda parte.

Ouvindo Marisa Monte em notas doídas e compassadas. Comparadas a Chico Buarque, tristemente profundo, desafinado e verdadeiro. Se Chico fosse afinado, seu samba seria a perfeição, e há de se convir que muita gente já derrama litros de emoções com a imperfeição, imagine então, com o contrário. Chico emociona porque tem a verdade errada das coisas; Marisa dói, porque é bonito e, beleza demais, machuca.

Procurando bem, todo mundo tem pereba, só a bailarina que não tem.

E tanto tempo passou desde quando era fácil depositar as culpas e os fracassos na vontade de ter afago de quem quer que fosse. Afago pra chamar de seu. Faz tempo que a minha vontade de cafuné virou vontade de quebra cabeça, sem frestas, sem furos, nem espaços por onde pudesse fugir a minha metade torta.

Enquanto o tempo passava, a minha certeza de uma só metade ficou perdida no meu quebra-cabeça completo de peças sem encaixe.

Mas eles são dois. Dois, e apenas dois, de tantos que falam comigo todos os dias, dentro do meu cérebro apressado nas ruas de São Paulo. São eles que andam comigo nas ruas arborizadas dos Jardins e pelo fedor calorento da yakisoba da Avenida Paulista. Andam comigo - e em mim - aonde quer que eu vá, de lá pra cá. Andam de fora pra dentro de mim, e saem de mim ainda mais fortes gritando paródias pelo mundo.

O poeta é um fingidor.

E da hora que eu acordo, até o último frame de segundo em que meus olhos se mantém abertos, o radar sensível que - por alguma razão - se instalou dentro de mim, capta as nuances e armazena. Sou um arquivo ambulante de coisas pela metade, mas a verdade é que, mesmo em pedaços, a minha mágoa é inteira porque, quando o mundo inteiro grita as desilusões de todas as pessoas no seu ouvido, acaba-se sofrendo um pouco por cada uma delas, também.

Sofrer vocês é sofrer a minha eterna dúvida de não saber o que é melhor pra mim.

Começo coisas e paro pela metade não porque eu não queira ver o final feliz se estampar no meu rosto desacreditado. Interrompo o gozo no meio porque, pra mim, a aflição dos novos começos atropela a calmaria do que já é meu.

Não é que eu não ame você, é só que eu não tenho certeza.
Os Strokes têm razão.

Mas a minha racionalidade se perdeu justamente onde eu a encontrei. Naturalidade demais me rendeu infelicidade, mas quando resolvi ser simetricamente certeira, perdi a emoção.

Finjo, então, ser dor. Aquela que sinto de verdade.
E vou.

No estreito do meio das decisões, esperando não haver escapatória, ignorando a visão das laterais, curvada, escondida, cardiacamente apressada por um final que, nem eu mesma, poderia palpitar.

Na minha frente há dois caminhos. E são, os dois, floridos.
Eu continuo sem buquê.